E a senhora, agora com 42 anos de casamento foi abandonada pelo marido.
Certa noite ele chegou do trabalho, tomou banho, jantou a comida preparada por ela, como todas as noites fazia, deliciou-se com a sobremesa, dispensou o café, levantou-se e comunicou:
- Estou indo, vou viver com a Regina. A Regina do salão.
Regina, ela se lembrou, era a viúva dona do salão de beleza da pequena cidade onde moravam. Uma senhora muito conservada, não aparentava a idade que tinha. Não era do tipo distinta no modo de se vestir. Gostava de vestidos justos, sutiã que deixa o peito empinado, salto alto, cabelo e maquiagem bem feitos, como tinha que ser. Apesar dessa exuberância toda, a mulher era muito discreta nas suas atitudes, mas diziam as más e invejosas línguas que entre quatro paredes...
E ele se foi. Deixou tudo para trás. Casa, carro, roupas. Levou seus documentos e sua escova de dentes.
A senhora ficou só. As filhas tinham ido há muito tempo, cada uma com sua família para se preocupar. E a senhora ficou só, naquela casa enorme onde tudo nasceu e agora morreu.
Só.
Ela lavou a louça do jantar, deixou a cozinha brilhando, como sempre fez. Pegou a bolsa e saiu pra dançar.
Só.
Chegou ao baile, encontrou as amigas, que já estavam comentando, entre elas, a atitude do ex marido ingrato. Sem perder tempo com o remoto passado, foi se divertir.
Ramiro, o açougueiro da cidade, estava lá como de costume. Todos os finais de semana o melhor “dançarino” da cidade era disputado pelas senhoras. Todas queriam dançar com ele. Dançar, porque, por mais bonito, charmoso, cheiroso e bom dançarino que esse homem fosse, sua, digamos assim, ignorância com as palavras não era suportada além do boa-noite-vamos-dançar-sim-obrigada.
E a mulher se divertia, saracoteava pelo salão, sem culpa, sem pensar no que passou e nem no futuro incerto. Sua energia era tão boa que contagiava a todos e Ramiro notou e pela primeira vez foi até uma dama tirá-la para dançar.
Aproximou-se e soltou: - Quer dançar mais eu?
- Meu Deus – ela pensou, e deu a gargalhada mais sincera de sua vida. Gargalhou por estar viva, do ex-marido, daquele baile, da pureza daquele homem. E saíram pelo salão.
Dançaram uma, duas, quatro músicas seguidas e ele, não se segurou e soltou:
- Olha dona, a senhora é gorda, mas gooooorda....
mas pra dançar, é levianinha, levianinha.....
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