22 de jun. de 2010

Os meninos da Rua Honduras

A CHUVA E A INFÂNCIA
A chuva chegou.
Forte, com muitos trovões.
Fiquei olhando pela janela, que fui fechar, a enxurrada que descia caudalosa pela rua.
Meus pensamentos, não sei porque razão, me levaram para a minha infância.
A mesma enxurrada agora, descia forte pela rua sem asfalto onde eu morava, ali na Rua Honduras, no Parque das Nações, em Santo André.
Era um domingo como hoje. Acabara de chegar da missa das oito aonde ia todos os domingos.
O cheiro do molho de tomate que minha mãe preparava na cozinha para a macarronada domingueira chegava até a mim. Nunca mais senti um cheiro como aquele que a Dona Yolanda preparava.
Outros cheiros vieram. O cheiro da terra molhada, o cheiro do meu pequeno quarto, da cera no piso vermelho passada na véspera, o cheiro do limoeiro que parecia cheirar mais quando chovia. Pequenos sons também vieram. O primeiro, o mais forte, era o da igreja anunciando a missa das onze, a última da manhã, mais elegante e frequentada pelas pessoas, vamos dizer assim, de mais posse, pois era nessa missa que o coral cantava regido pelo Albino e a Rosinha - a mais elegante das coralistas cantava com emoção o Te Deum. Era também nessa missa que se arrecadava mais esmolas, isso dito pelo Padre Fiorente. Um italiano gorducho e vermelhão que de vez em quando vinha filar a macarronada do domingo.
Mas estava falando dos pequenos sons.
O de meu pai folheando o Estadão e numerando os cadernos com caneta para depois iniciar a leitura que duravam umas duas horas, entrecortada com comentários raivosos e cheio de palavrões sobre os políticos da época. Iguais aos que faço hoje. Parece-me que os políticos continuam iguais e eu ficando igual ao meu pai.
Minha mãe cantarolando a mesma música triste que acompanhou toda minha infância.
Estou ouvindo ela agora: Era de tardezinha, os sinos tocavam...Paulo, meu Paulo, morreste por mim. Pequenas frases da canção que ainda me lembro.
Meu irmão Cláudio, brincando com o nosso cachorro Lulu , tão bonito, peludo e de cor dourada. Um dia, o nosso Lulu, amanheceu morto no terraço de casa ao lado de um pedaço de carne envenenada, jogada pelo vizinho.
Nunca entendi a razão dessa crueldade.
Depois de enterrá-lo, jurei nunca mais ter outro cão.
A chuca passou, como agora.
O ar ficou mais fresco, mas uma saudade imensa tomou conta do meu coração.
ANTÔNIO PETRIN
dos 8 aos 72 anos.
Eu, entre os meninos da Rua Honduras

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