Todo último domingo do mês a senhora reunia a família em sua casa. Filhos, netos, genros, noras. A família era grande, bem grande. Às vezes gente nova aparecia vinda de alguma história afetiva de algum membro da família. Uns ficavam mais tempo que outros e tinha aqueles também que deixava saudades.
Mas a senhora estava sempre ali a preparar com suas mãos o mesmo cardápio de cada encontro: nhoque ao sugo e rocambole de doce de leite para a sobremesa.
Hummm, mesmo sabendo o que iam comer, todos esperavam ansiosos por aquele almoço e adoravam aquele cheiro, aquele gosto, aquela atmosfera familiar e ali se sentiam protegidos, amados e amando.
Durante o almoço, os assuntos passavam pela casa, pelos filhos, trabalho, política, dinheiro, a falta e a satisfação que ele faz e dá na vida. Falavam de felicidade, de tristezas, decepções. Falavam de ambições e de amores conquistados e perdidos. Falavam o que queriam, porque ali todos se sentiam a vontade e eram ouvidos. Ouvidos por todos e, claro, pela sábia senhora que como um ritual perguntava se tinha acontecido naquele mês a maior alegria ou a maior tristeza de suas vidas. Quando isso acontecia, esperavam ansiosos por aquele momento, o momento da pergunta, porque se ela achasse que a alegria ou a tristeza era realmente grande, ela entregava um bilhete para cada um – o da tristeza e o da alegria.
Ah! O bilhete.
Quem o lia, em seu silêncio, tinha em seu semblante uma mistura de surpresa, emoção e paz. E ninguém sabia o que estava escrito ali e também não falavam depois que o liam.
Uma vez, depois de algumas tentativas para ser escolhida a história mais triste ou mais alegre, a moça conseguiu. E pelo acontecimento mais feliz da família daquele mês. Que felicidade então!
Ansiosa, e orgulhosa, chegou próximo da senhora junto com o “dono” da história mais triste e receberam, cada um, seus bilhetes.
Leu e caiu em si. Continuou feliz e orgulhosa, claro, mas aquela frase..aquela frase a fez pensar, também. – Se eu recebi essa frase como a história mais feliz, o que teria recebido se fosse a história mais triste? - Pensou ela.
Inquieta, desde sempre, ela não podia deixar essa pergunta sem resposta. Embora tivesse exemplos e exemplos – e também o respeito pela senhora – de não saber do conteúdo do outro bilhete ela não agüentou e da maneira mais discreta ela deu um jeito.
O rapaz da história triste, ela percebeu, leu o bilhete e o colocou no bolso do seu casaco. No fim da tarde quando os moços foram fazer um gol a gol na rua tranqüila onde a senhora mora, ela sorrateiramente foi até o casaco deixado na cadeira da biblioteca quando por sorte a mulherada preparava um café da tarde, e ali sozinha ia desvendar esse segredo – e que ia ficar só pra ela, porque JAMAIS ela ia contar pra alguém.
Achou o papel, abriu, leu, fechou e o colocou no mesmo lugar.
O que estava escrito no papel da história triste era a mesma frase que estava escrito no papel da história feliz.
Saiu da biblioteca, foi até o banheiro e se fechou para absorver o que tinha lido e de novo caiu em si e entendeu que não era a toa que todas aquelas pessoas deixavam o último domingo do mês para ir aquela casa. Ninguém sairia dali do mesmo jeito que entrou.
Um comentário:
A narração mostra:Uma família unida mas com os seus poblemas em si e em todos.
São Paulo 26/02/2010.
Luiz Petrin Junior.
Agradeço.
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